A César o que é de César, mas tão somente o que é de césar, nada a mais do que o devido e justo.

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STJ - Creditamento Icms na compra de álcool anidro misturado a gasolina A para produzir a gasolina C

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22 Agosto | 2018

RECURSO ESPECIAL Nº 1.541.829 - PB (2015/0162127-4)
RELATOR : MINISTRO GURGEL DE FARIA
RECORRENTE : SETTA COMBUSTÍVEIS LTDA
ADVOGADOS : CARLOS AUGUSTO SOBRAL ROLEMBERG - DF008282
PAULO ROBERTO SARAIVA DA COSTA LEITE - DF003333
ADVOGADOS : PATRÍCIA FREIRE CALDAS HERÁCLIO DO RÊGO RODRIGUES
DIAS - PE021146
ARNALDO RODRIGUES DA SILVA NETO - PE017762
RECORRIDO : ESTADO DA PARAÍBA
PROCURADOR : RICARDO RUIZ ARIAS NUNES E OUTRO(S) - PB017877B
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. MANDADO DE
SEGURANÇA. DECLARAÇÃO DO DIREITO A CRÉDITO DE
ICMS. SÚMULA 213 DO STJ. PEDIDO ADMINISTRATIVO.
INDEFERIMENTO AO FUNDAMENTO DE QUE OS CRÉDITOS
JÁ FORAM APROVEITADOS. VIOLAÇÃO DA COISA
JULGADA. INOCORRÊNCIA.
1. O Plenário do STJ decidiu que “aos recursos interpostos com
fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de
março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na
forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça” (Enunciado
Administrativo n. 2, sessão de 09/03/2016).
2. Recurso especial em que se discutem os limites objetivos decorrentes
da coisa julgada formada pela sentença mandamental que, fundada no
princípio da não cumulatividade, declarou à impetrante, na condição de
distribuidora de combustíveis, o direito ao crédito do ICMS incidente
sobre o álcool anidro que é utilizado na mistura para a produção da
gasolina tipo "C".
3. A coisa julgada formada pela sentença mandamental que, nos termos
da Súmula 213 do STJ, declara o direito à compensação tributária (no
caso, creditamento de ICMS) não contempla juízo de certeza e de
liquidez do crédito decorrente do reconhecimento do direito vindicado;
essas questões somente serão verificadas em etapa posterior, mediante
provocação do fisco pelo impetrante, momento em que serão apurados e
liquidados os créditos segundo os critérios estabelecidos no comando
judicial, ressalvado à Administração o poder de fiscalizar a correção da
pretensão que lhe é apresentada pelo contribuinte.
4. Hipótese em que o indeferimento administrativo do pedido da
impetrante de recebimento dos créditos de ICMS, por meio de emissão
de nota fiscal de ressarcimento, não configurou ofensa à autoridade da
coisa julgada, pois a Administração não se negou a apurar a existência e
o quantum do crédito oriundo do direito reconhecido na sentença, tendo
até mesmo identificado a sua dimensão econômica e assentado a
impossibilidade de ressarcimento desses mesmos créditos, porquanto já
teriam sido efetivamente aproveitados em favor da empresa impetrante,
por meio de abatimento do valor da mercadoria quando de sua aquisição
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junto à refinaria.
5. O fundamento apresentado pelo fisco, respaldado na impossibilidade
de se conceder créditos em duplicidade, pode ser objeto de impugnação
pelo administrado, em ação própria, em que admitida ampla dilação
probatória, para que, ao final, se for o caso, obtenha provimento judicial
de natureza condenatória apto a impelir o fisco à quitação de eventuais
créditos subsistentes.
6. Nesse contexto, revela-se inadequada a decisão de primeira instância
que, sob o pretexto de dar cumprimento à sentença mandamental de
caráter exclusivamente declaratório, determinou ao fisco a satisfação
dos créditos em valor certo e desprezou a alegação de duplicidade de
creditamento, assumindo, assim, caráter condenatório de ação de
cobrança, que, como cediço, não é próprio de mandado de segurança,
consoante inteligência das Súmulas 269 e 271 do STF.
7. Recurso especial não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, prosseguindo
o julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Benedito Gonçalves, por unanimidade , negar
provimento ao recurso especial nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros
Napoleão Nunes Maia Filho, Benedito Gonçalves (voto-vista), Sérgio Kukina e Regina Helena
Costa (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 15 de maio de 2018 (Data do julgamento).
MINISTRO GURGEL DE FARIA
Relator
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RECURSO ESPECIAL Nº 1.541.829 - PB (2015/0162127-4)
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO GURGEL DE FARIA (Relator):
Trata-se de recurso especial interposto por SETTA COMBUSTÍVEIS
LTDA., fundado na alínea "a" do permissivo constitucional, contra acórdão assim ementado
(e-STJ fl. 952):
AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE ORDEM MANDAMENTAL.
CRÉDITO DE ICMS SUPOSTAMENTE GERADO QUANDO DA SAÍDA DE
ÁLCOOL ANIDRO DA USINA PARA A DISTRIBUIDORA. UTILIZAÇÃO
PARA ABATIMENTO DO DÉBITO REFERENTE À FASE SUBSEQUENTE DA
CADEIA PRODUTIVA – SAÍDA DA GASOLINA TIPO "C" DA
DISTRIBUIDORA. INVOCAÇÃO DO PRINCÍPIO DA NÃO
CUMULATIVIDADE. SEGURANÇA CONCEDIDA. TRÂNSITO EM JULGADO.
CUMPRIMENTO DA SENTENÇA. INDICAÇÃO DE CRÉDITO
DESVINCULADA DE QUALQUER OPERAÇÃO DE SAÍDA RELATIVA À
CADEIA PRODUTIVA. ICMS SUJEITO A SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA
PROGRESSIVA. ADIANTAMENTO INTEGRAL PELA REFINARIA, NA
QUALIDADE DE SUBSTITUTA DE TODOS OS AGENTES DO CICLO
PRODUTIVO. IMPOSSIBILIDADE FÁTICA DE CREDITAMENTO PELA
DISTRIBUIDORA. SENTENÇA INEXEQUÍVEL. LIQUIDAÇÃO COM "VALOR
ZERO". DISTINÇÃO ENTRE REDISCUSSÃO DA COISA JULGADA E
INEXEQUIBILIDADE, NO PLANO FÁTICO, DO DECISUM.
INTERLOCUTÓRIA ANULADA. EXECUÇÃO EXTINTA. PROVIMENTO.
1. Na cadeia produtiva da gasolina tipo "C", a refinaria, quando da saída da
gasolina tipo "A", adianta o recolhimento do ICMS referente a cada uma das
etapas subsequentes, inclusive aquele devido pela saída de álcool anidro da
usina à distribuidora, que realiza a mistura dos dois subprodutos para a
confecção do produto final destinados aos postos de combustível.
2. O regime de substituição tributária progressiva, por força do qual a refinaria
absorve a responsabilidade, antecipadamente, por todos os recolhimentos, torna
impossível o abatimento de qualquer débito, pela distribuidora, ao longo da
cadeia, porquanto esta empresa não está sujeita à obrigação de pagamento do
ICMS em nenhum momento, é dizer, não se pode abater débito inexistente.
3. A afirmação da inexequibilidade da Sentença com base na teoria da liquidação
"com dano zero"ou "sem resultado positivo" não implica em rediscussão da
coisa julgada. Precedentes do STJ.
Rejeitados os embargos de declaração opostos pelo fisco e pela empresa
(e-STJ fls. 990/995).
Nas suas razões (e-STJ fls. 1.001/1.035), a empresa alega violação dos
arts. 467, 471, 473, 474 e 535 do CPC/1973. Sustenta, preliminarmente, que é nulo o acórdão
recorrido, porquanto teria sido omisso quanto à análise dos dispositivos legais que embasam a sua
tese recursal, e, no mérito, que a conclusão adotada pela Corte estadual, ao dar provimento ao
agravo de instrumento fazendário, para extinguir a execução de sentença mandamental, por
entendê-la inexequível, ofendeu a coisa julgada formada por esse título judicial.
Para tanto, aduz que o acórdão recorrido busca alterar uma premissa
fática assentada pela sentença exequenda, qual seja, a de que houve "o pagamento de ICMS do
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álcool anidro pela Recorrente e seu não creditamento; modificando-a, para, neste momento,
afirmar que a refinaria seria a contribuinte de tal tributo e que a Recorrente por não pagá-lo, não
poderia se creditar, e, por isso, o crédito seria zero, por ausência de valor a ser creditado".
Afirma que "uma coisa é a ausência de crédito nos limites da coisa
julgada, o que atualmente se chama de 'dano zero' ou 'crédito zero', outra coisa é a modificação
do entendimento quanto à tributação do álcool anidro para modificar o direito ao crédito
concedido à Recorrente e, há muito, transitado em julgado".
Destaca, ainda, o seguinte trecho da sentença transitada em julgado, o
qual demonstraria a existência de pagamento de ICMS incidente sobre o álcool anidro pela
distribuidora, apto a ensejar o creditamento:
De modo que, depreende-se com a florada clareza que a refinaria ou central
petroquímica atua sempre como substituta tributária das distribuidoras
(impetrantes), retendo e repassando o ICMS ao Estado arrecadador, tanto nas
operações internas como nas interestaduais realizadas com o álcool etílico
anidro combustível.
(...) Omissis
Anote-se por oportuno que a hipótese impeditiva da compensação, prevista
pelo inciso II, alíneas 'a' e 'b' do § 2º do art. 155 da CF/88 não se enquadra no
cenário da "isenção ou da não incidência", conquanto há INDUVIDOSA
incidência do ICMS nas operações da impetrante com álcool anidro
combustível, interna e interestadual.
(...) Omissis
Constata-se assim, que as operações referidas são aquisições com diferimento
do ICMS do álcool anidro combustível até o instante da saída de seu produto
(gasolina 'C'), momento em que a IMPETRANTE PAGA o ICMS referente à sua
saída: Gasolina 'C' mais o ICMS do seu insumo: Álcool Anidro.
Entretanto, não efetua o direito ao abatimento relativamente ao insumo.
Assinale-se que merece distinção a diferença entre destilaria de álcool, que não
tem como aproveitar os créditos de ICMS das suas entradas, enquanto A
SITUAÇÃO DA IMPETRANTE É DE DISTRIBUIDORA QUE PAGA O
TRIBUTO (álcool anidro - insumo), mas não se credita pelo princípio da
não-cumulatividade inerente ao ICMS.
(...) Omissis
Desta feita, resta inconteste que: se houve a tributação do ICMS nas operações
de entrada e de saída da impetrante, esta deve proceder com o abatimento do
crédito das entradas quando da apuração do tributo devido na saída. Já que não
há que se falar em não-incidência ou isenção, única situações impeditivas na
geração de créditos de ICMS.
(...) Omissis
Essa tributação diferida é cristalina no RICMS/PB (Decreto nº 18930/97), ao
fixar a alíquota de 2 5% (vinte por cinco por cento) do ICMS a ser aplicada em
tais casos, consoante art. 13, inciso c, alínea 'g'. Mencionado, ainda, como
hipótese para pagamento de créditos acumulados de ICMS, as hipóteses de
obrigações decorrentes de diferimento - artigos 90 e 91, inciso I, in litteris: (...)
A liquidez do direito da Impetrante ficou demonstrada pela relevância dos
fundamentos da sua postulação quando se identifica com clareza solar ser
justo e legal a pretensão do crédito para a compensação do valor do tributo pago
na entrada (compra de insumo), com o tributo devido em decorrência da saída
(produto beneficiado).
Salienta, também, que a aplicação do "dano zero/crédito zero" se dá
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apenas quando "o fato probandi seja superveniente ao título, tal qual a liquidação por
artigos/arbitramento", o que não seria o caso dos autos.
Indaga: "se o direito ao crédito analisado pela r. sentença depende
exatamente desta incidência de ICMS na aquisição do álcool anidro, desse pagamento feito pela
ora Recorrente e de uma saída também tributada pelo ICMS da gasolina "C" para que possa ser
concedido - e, foi exatamente esta incidência que foi analisada pela r. sentença transitada em
julgado - como poderia o r. acórdão estar a rediscutir essa incidência, afirmando a suposta não
incidência e não pagamento pela Recorrente do ICMS desta operação para concluir pelo suposto
'crédito zero' e não está infringindo a coisa julgada (rediscussão da questão preclusa, eivada de
imutabilidade)?"
Traz parecer jurídico do ilustre Professor Fredie Didier que aponta a
certeza do título exequendo, assentando, ainda, que o óbice mencionado no acórdão recorrido
residiria em eventual "erro de fato", o qual, no máximo, permitiria ingresso de ação rescisória,
sem, contudo, interferir na exequibilidade do título judicial transitado em julgado. Destaca, ainda,
desse parecer, os seguintes trechos:
(...) No caso dos autos, a impetrante, ora consulente, afirmou na petição inicial
que a refinaria, substituta tributária, era quem recolhia aos cofres públicos os
valores de ICMS relativos a todas as operações, inclusive à operação de saída de
gasolina "c", retendo, da impetrante, os montantes correspondentes no
momento em que esta adquiria, junto à refinaria, a gasolina tipo "a". TAIS
FATOS SÃO INCONTROVERSOS NOS AUTOS.
Tais fatos foram afirmados pela impetrante para compor a causa de pedir da
demanda. Em nenhum momento, disse ela ser a substituta tributária ou recolher,
diretamente, os valores junto ao Fisco estadual.
Foi em razão de tais fatos que a impetrante afirmou ser titular de direitos de
créditos junto ao Estado da Paraíba, já que os valores tributados lhe eram
retidos pela refinaria, afirmando ser titular do direito de que,
administrativamente, tais créditos fossem reconhecidos e satisfeitos. Foi em
razão de tais fundamentos que a impetrante formulou os pedidos, acolhidos
"nos termos postulados".
Arremata que "o caso dos autos é TOTALMENTE diferente da
teoria do dano zero, visto que foi determinado o direito aos créditos de ICMS pelas aquisições
tributadas do álcool anidro para abatimento nas saídas também tributadas de gasolina C pela
Recorrente, por entender que a Recorrente é a contribuinte do ICMS nessa operação e
não havia qualquer abatimento do ICMS ao álcool anidro pela aquisição de tal produto, em função
da saída tributada da gasolina C, o que gera direito a crédito pelo Princípio da
não-cumulatividade. E mais, se o ICMS do álcool anidro tem alíquota positiva e não foi
creditado/abatido à Recorrente, por óbvio que não pode ser comparado a hipótese de
crédito zero/dano zero", realçando que o próprio fisco apurou o crédito reclamado relativo a
fevereiro de 2013, no importe de R$ 91.862,20.
Contrarrazões apresentadas pelo ESTADO DA PARAÍBA, às e-STJ
fls. 1.078/1.104, pelas quais defende o não conhecimento do especial, em razão do óbices das
Súmulas 7 do STJ e 283 do STF e por buscar o recurso a análise de violação de preceitos
constitucionais. Quanto ao mérito, busca a manutenção do acórdão recorrido, com base nos
seguintes argumentos: (i) a coisa julgada em questão não trouxe "resultados práticos ao vencedor
da ação, a exemplo de quando o quantum debeatur igualar-se a zero"; (ii) "a sentença
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reconhece o dever de aplicação do princípio da não-cumulatividade e, nesse sentido, garante a
compensação a partir do ICMS pago efetivamente pela Recorrente, o que remete todos os
termos do procedimento para uma fase superveniente e administrativa. Entretanto, no momento
em que se faz presente a apuração das operações, para fins de compensação, a Recorrente não
obteve êxito em individualizar os supostos créditos a partir do pressuposto consubstanciado no
pagamento do ICMS"; (iii) "ainda que a Recorrente queira utilizar o instituto da coisa julgada
para beneficiar-se, não se pode passar por cima de fato indiscutível, qual seja, NÃO HÁ
CRÉDITO, ou seja, o pronunciamento jurisdicional não pode admitir a invenção de um crédito
somente para se dizer que a coisa julgada foi efetivada"; (iv) não há violação da coisa julgada,
visto que a ordem judicial "resguardou ao órgão fazendário o pleno direito de fiscalizar e verificar
os créditos da Recorrente, além de apurar a correção do valor indicado e lançar de ofício o que
considerar resultante de erro de apuração (...) ou seja, deve-se destacar que a declaração do
direito à compensação, conteúdo efetivamente transitado em julgado, não se confunde com a
apuração dos créditos em si"; e (v) "a Recorrente busca disfarçadamente evitar a apuração dos
créditos nas operações em referência e negar a previsão da análise do crédito em fase posterior,
alegando que tal circunstância tem o efeito de violar a coisa julgada".
Decisão a quo de admissão do recurso especial às e-STJ fls.
1.111/1.112.
É o relatório.
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RECURSO ESPECIAL Nº 1.541.829 - PB (2015/0162127-4)
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO GURGEL DE FARIA (Relator):
Inicialmente, destaco que o Plenário do STJ decidiu que “aos recursos
interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de
2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as
interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça” (Enunciado
Administrativo n. 2, sessão de 09/03/2016).
Conforme relatado, o presente recurso especial discute os limites
objetivos decorrentes da coisa julgada formada pela sentença mandamental que, fundada no
princípio da não cumulatividade, declarou à impetrante, na condição da distribuidora de
combustíveis, o direito ao crédito do ICMS incidente sobre o álcool anidro que é utilizado na
mistura para a produção da gasolina tipo "C".
O quadro fático foi assim delineado pelo acórdão recorrido (e-STJ fls.
945 e seguintes):
O Estado da Paraíba interpôs Agravo de Instrumento contra a Decisão do Juízo
da 6ª Vara da Fazenda Pública da Comarca desta Capital, f. 867/869, prolatada
nos autos do Mandado de Segurança impetrado por S Distribuidora de
Combustíveis., atualmente denominada SETTA Combustíveis S.A, que
determinou o cumprimento da ordem mandamental transitada em julgado, qual
seja, o creditamento de valores pagos a título de ICMS referentes à aquisição de
álcool anidro combustível destinado à produção da gasolina tipo "C".
Alegou que a Sentença ressalvou expressamente a prerrogativa da
Administração Fazendária de apurar o quantum a ser compensado e que o valor
por ela computado a título de ICMS devido, R$ 91.862,20, já havia sido
aproveitado pela ora Agravada, pelo que sua compensação foi
administrativamente indeferida sob pena de se locupletar duplamente desta
faculdade tributária, não abarcada pela coisa julgada material, que não garantiu a
vinculação estatal à metodologia de cálculos apresentada em juízo.
Sustentou, ainda, que a duplicidade diagnosticada no curso da execução não se
confunde com o que foi discutido na fase cognitiva, pelo que deve ser
impugnada por meio processual autônomo, sob pena de indevido elastecimento
dos limites objetivos da coisa julgada.
Por fim, afirmou que a discussão a respeito de valores compensáveis não pode
ser aviada em sede de mandado de segurança (Súmula nº 269, do STF) e que a
Decisão agravada feriu o contraditório e a ampla defesa, bem como o art. 474, do
Código de Processo Civil.
[...]
Nas Contrarrazões, fl. 890/899, a Agravada alegou que a Interlocutória agravada
determinou o cumprimento puro a simples do comando sentencial, que o
Recorrente pretendeu rediscutir matéria albergada pela coisa julgada material,
qualificando a conduta como litigância de má-fé, e que o privativo poder de
apuração da Administração Fazendária não foi suprimido, porquanto ela própria
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indicou o valor a ser creditado mediante prévia provocação, pugnando, ao final,
pelo desprovimento recursal.
[...]
A Agravada impetrou, na origem, Mandado de Segurança com o objetivo de se
creditar dos valores de ICMS referentes à compra de álcool anidro combustível
de usina, produto misturado com gasolina tipo "A", adquirida de refinarias, para
formação da gasolina tipo "C", destinada à venda aos postos de combustível e,
subsequentemente, ao consumidor final (atualmente composta por 75% de
gasolina tipo "A" e 25% de álcool anidro).
Cumpre salientar que as partes, embora basicamente confirmem essa
realidade, agregam a ela algumas outras circunstâncias. No recurso especial, narra a empresa
(e-STJ fls. 1.002 e seguintes):
Cuida-se, originariamente, de Mandado de Segurança impetrado pela ora
Recorrente, em que foi concedido o direito aos créditos do ICMS advindos das
aquisiçoes tributadas/diferidas de álcool etílico anidro combustível, para mistura
com gasolina tipo 'A' e transformação em saída de gasolina tipo 'C'.
Ultimados todos os atos processuais pertinentes, a r. sentença mandamental
transitou em julgado em 10.04.2008.
Em 01.07.2009, o Estado, ora Recorrido, ajuizou Ação Rescisória distribuída sob
o n. 200.2005.017604-5/004, em que tentou desfazer a r. sentença transitada em
julgado, no entanto, o E TJPB julgou improcedente tal ação rescisória e, o r.
acórdão, após todos os atos processuais pertinentes e recursos cabíveis,
também transitou em julgado em 16.08.2012.
Após o trânsito em julgado de tal ação rescisória, e com o retorno de todos os
atos dos E. Tribunais Superiores, o Exmo. Juízo de primeira instância determinou
as fls. 436 o cumprimento imediato da segurança (ordem mandamental) à
autoridade coatora, tendo esta sido notificada em 25.01.2013 (certidão a fls.
439-verso).
Ocorre que, após a concessão de prazo de 60 dias pelo Exmo. Juízo de primeira
instância, ao invés de cumprir com a ordem mandamental como informado, o
Estado, ora Recorrido apresentou exceção de pré-executividade. Verificando a
total impropriedade de tal exceção, bem como o completo intuito
procrastinatório, o Exmo. Juízo de piso indeferiu o pedido de liminar.
Não obstante, não satisfeito com tal decisão, o Estado, ora Recorrido, interpôs o
AGTR 200.2005.017604-5/006, que o Exmo. Desembargador Relator entendeu por
bem em indeferir a liminar e julgar improcedente, encontrando-se com Recurso
Especial e Extraordinário interpostos pelo Estado, ora Recorrido, em sede de
juízo de admissibilidade.
Dando continuidade à execução de sentença mandamental, o Exmo. Juízo de
primeira instância proferiu v. decisão determinando o cumprimento da ordem
mandamental, em 10 dias, tal qual metodologia aplicada e indicada pelo próprio
Recorrido/Autoridade Fazendária Coatora às fls. 679/680.
Contra essa v. decisão, insurgiu-se o ora Recorrido, pelo recurso de agravo de
instrumento de n. 200.2005.017604-5/008, tentando rediscutir a matéria transitada.
Analisando o pedido de liminar para anulação da execução da sentença
mandamental, o Exmo. Desembargador Relator do E. TJPB entendeu por bem em
indeferi-lo; no entanto, analisando o mérito do recurso /008, entendeu por bem
em provê-lo para extinguiu a execução em curso por suposta inexequibilidade do
título aplicando a teoria do 'dano zero'.
A Fazenda Pública, por sua vez, na peça inaugural do agravo de
instrumento, conta (e-STJ fls. 3 e seguintes):
Trata-se de agravo instrumento interposto contra decisão judicial que, a título
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de efetivação da segurança concedida e transitada em julgado, estabelece ordem
contra o ora Agravante a qual exorbita os próprios limites objetivos da coisa
julgada.
O mandado de segurança originário tem como objeto o direito da parte
Agravada aproveitar os créditos de ICMS gerados nas operações de compra do
álcool anidro das destilarias que, por sua vez, são recolhidos no momento da
saída da gasolina tipo "c".
O Estado da Paraíba impugnou a pretensão autoral sob o fundamento que a
Agravada não teria o direito à compensação.
A respectiva segurança fora concedida e transitou em julgado após a lavratura
de acórdão que manteve a sentença em todos os seus termos, especificamente,
reconhecendo o direito da Agravada em proceder com a compensação dos
créditos a serem calculados e apurados administrativamente, in verbis:
"...
No que alude a compensação, sobreleva ressaltar que, uma vez garantido
o direito à manutenção e utilização desses créditos, mantém-se
resguardado à Administração Pública o pleno direito de fiscalizar e
verificar os créditos da impetrante, apurando a correção do quantum
escriturado e/ou compensado e lançar de ofício o que considerar
resultante de erro na apuração.
...
"Ao Judiciário incumbe apenas declarar o direito à compensação, ficando
resguardado a administração do direito de fiscalizar a liquidez e certeza
dos créditos compensáveis. Recurso especial parcialmente provido."
(STJ. 2ª Turma. Resp n.º 513333/RJ. Relator Min. João Otávio de Noronha.
DJU 21.02.2005, p. 133)...
...
Ante o exposto, com fundamento no art. 5º, LV, da Constituição Federal,
combinado com o art. 11 da Lei nº 1.533/51, CONCEDO A SEGURANÇA
nos termos postulados na exordial".
Ou seja, muito embora a Agravada tenha obtido a coisa julgada especificamente
para garantir o direito de proceder tal compensação, restou devidamente
ressalvada na ordem judicial que o aproveitamento de tais créditos não impediria
uma prévia apuração e fiscalização na seara administrativa.
Nesse toar, a Agravada pleiteou perante o órgão fazendário o aproveitamento de
créditos de ICMS gerados em determinado período no valor de R$ 408.467,47.
Na fase de apuração administrativa do referido pleito de compensação, a
fiscalização tributária calculou o imposto que seria devido com base na ordem
judicial e encontrou o montante de R$ 91.862,20, entretanto, negou a respectiva
compensação pelo fato que os mencionados créditos já terem sido objeto de
aproveitamento e benefício a favor da Agravada, de modo que a autorização
geraria uma dupla compensação não permitida pela coisa julgada.
A partir de tal resposta administrativa, a parte Agravada pretensiosamente
inovou no processo de mandado de segurança e, no intuito de obter a
compensação dos créditos a qualquer custo, procedeu com pedido impositivo
contra o Estado da Paraíba, consistente no aproveitamento do crédito pelo qual
já se beneficiou, sob o fundamento que o órgão fazendário estaria rediscutindo
o direito de compensação.
Além disso, pleiteou o cumprimento de ordem judicial através da imposição de
valores concretos, trazendo aos autos uma indevida adoção vinculada de uma
suposta "metodologia de cálculos" que, destaque-se, não foi garantida na Coisa
Julgada.
Nada obstante tudo isso, tal desiderato superveniente da Agravada e
exorbitante do direito transitado em julgado foi deferido pelo juízo de primeira
instância, nos seguintes termos:
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"...
Assim, diante da ausência de comprovação efetiva da autoridade coatora
no cumprimento da sentença mandamental de fls. 222/238, mas da
comprovação mas fls. 679/680 da existência de metodologia da cálculo
para cumprimento estabelecido pela própria impetrada, determino que a
autoridade coatora "vise" todas as notas fiscais apresentadas pela
empresa, nos valores encontrados, utilizando o mesmo procedimento
indicado para todo o período abrangido pela sentença transitada em
julgado em 10.04.2008, tal qual o valor de R$ 91.862,20, referente ao mês
de fevereiro de 2013, encontrado as fls. 680.
Intime-se, com urgência, a autoridade coatora para comprovar o
cumprimento de tal decisão, no prazo de 10 (dez) dias, ficando de já ciente
que o descumprimento desta ordem, acarretará encaminhamento de
representação por ato de improbidade administrativa (art. 11, II, da lei nº
8.429/92) à autoridade competente, além das providências de ordem
criminal, sem prejuízo das medidas coercitivas necessárias ao respeito,
efetivamente a eficácia das ordens judiciais."
Entretanto, da leitura atenta das razões da resposta da Secretaria da Receita,
evidencia-se que a negativa do pleito administrativo não se deu em razão do
órgão fazendário não reconhecer o direito de compensação, nem mesmo por
pretender rediscutir a matéria, mas sim pela fiscalização ter evidenciado que os
créditos compensáveis já terem sido objeto de aproveitamento a favor da
Agravada, de modo que contra essa última decisão judicial é interposto o
presente agravo de instrumento (...).
Nesse sentido, o referido processo administrativo de fls. 623/721, o crédito
incidente sobre o álcool anidro foi objeto de abatimento do ICMS devido pelas
aquisições da Impetrante/Agravada à Refinaria, de sorte que o combustível
adquirido pela Agravada entrou no estabelecimento da mesmo com menor
preço, insiste-se, justamente pelo abatimento em referência.
Cabe, ainda, expor as razões despendidas pela empresa na contraminuta
do agravo de instrumento para impugnar o fundamento fazendário que motivou o indeferimento
da compensação na esfera administrativa, de que o crédito perseguido já havia sido aproveitado
na própria sistemática de substituição, quais sejam (e-STJ fls. 913 e seguintes):
Ora, Exmo. Desembargador Relator, se a r. sentença transitada em julgado
determinou que a Agravada tem direito aos créditos de ICMS de AEAC que
nunca foram concedidos, como vem agora, a Agravante, dizer que os concedeu
e que não há o que creditar?
Afirmar que o crédito existe, mas que já foi utilizado na sistemática de apuração
da substituição tributária progressiva, é o mesmo que dizer que a r. sentença
transitada em julgado não julgou direito nenhum!
Percebendo esse efetivo descumprimento da ordem mandamental, com
rediscussão patente do mérito da ação transitada em julgado, de que o Exmo.
Juízo de primeira instância entendeu por bem em determinar, de uma vez por
todas, o efetivo cumprimento da ordem, sob pena de encaminhamento ao
Ministério Público de representação por crime de improbidade administrativa.
Ao determinar que o cumprimento da ordem mandamental se fizesse por visto
nas notas fiscais com base em metodologia constante das fls. 679/680 efetuada
por cálculo do crédito de fevereiro/2013, o Exmo. Juízo a quo não inova no feito
nem destoa do rito mandamental a ser seguido, mas sim, faz prevalecer sua
sentença mandamental, agora, com embasamento não só jurídico, mas também
técnico trazido pela própria Agravante, quanto ao seu cumprimento.
Em nenhum momento o Exmo. Juízo apurou o valor de fevereiro/2013, quem o
encontrou foi a própria Agravante em parecer de fls. já citadas; o que o Exmo.
Juízo fez foi, apenas e tão somente, determinar que esse cálculo fosse feito para
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todo o período abrangido pela v. sentença, ou seja, para efetivação do
cumprimento da ordem mandamental há muito transitada em julgado.
Aos auspícios da r. sentença que determinou a apuração e fiscalização do
quantum debeatur na via administrativa, o Agravante, está rediscutindo a
matéria pela enésima vez e induzindo esse Exmo. Desembargador Relator em erro
sobre as falaciosas: inovação e ordinarização e ausência de crédito.
O direito da Agravante à fiscalização e a apuração dos créditos se limita a
apuração do quantum e não a rediscussão do direito ao crédito.
Ao encontrar o valor de R$ 91.862,20 como crédito na nota fiscal de
fevereiro/2013, e não o valor de R$ 408.467,47, o agravante estava, aí sim,
fiscalizando e apurando o crédito da agravada - que em nenhum momento
discordou de tal metodologia e cálculo - no entanto, ao afirmar que tal crédito já
teria sido utilizado pela sistemática de tributação, rediscutiu a matéria, ferindo a
coisa julgada material e demonstrando que não pretende cumprir a r. ordem
mandamental.
Quando do julgamento do agravo de instrumento fazendário, o qual foi
provido, o Tribunal de origem afastou a alegação de violação da coisa julgada pela decisão
administrativa de indeferimento da compensação, assentando tratar o caso dos autos de sentença
inexequível, já que o direito ao crédito vindicado pressuporia o recolhimento do tributo, o que, na
cadeia mercantil dos combustíveis, não se daria pela distribuidora impetrante, mas sim pela
refinaria, que recolhe o ICMS incidente sobre o álcool anidro e a gasolina tipo "C", pela
sistemática da substituição tributária. Ao interpretar a motivação contida na sentença
mandamental, concluiu, ainda, que os créditos reconhecidos somente poderiam ser utilizados para
o abatimento do valor de ICMS devido quando da saída da gasolina tipo "C", o qual não é
recolhido pela distribuidora, não podendo ser aproveitados em outra cadeia produtiva não sujeita à
substituição tributária. Confira-se (e-STJ fls. 954 e seguintes, com grifos adicionados):
A cadeia produtiva – formada, nesta sequência, por refinaria, distribuidora,
posto de combustível e consumidora final – está submetida ao chamado regime
de substituição tributária "para frente" ou progressiva, instituída com o intuito
de fortalecer a fiscalização da Administração, que passa a se concentrar em um
número relativamente pequeno de sujeitos, contribuindo para a redução da
evasão fiscal.
A refinaria, ao vender a gasolina tipo "A" para a distribuidora, recolhe aos
cofres do Estado o ICMS devido em virtude da saída desta específica
mercadoria – assinalado nos documentos fiscais como "ICMS" ou "ICMS
Normal", e antecipa o recolhimento do tributo que, não fosse a substituição,
somente seria devido após o término de cada fase produtiva, isto é, no momento
da saída de cada subproduto.
O ICMS devido pela saída do álcool anidro da usina até a distribuidora é
antecipadamente recolhido pela refinaria (no caso, a Petrobrás), assim como o
tributo devido pela saída da gasolina tipo "C" da distribuidora aos postos de
combustível (resultante da mistura da gasolina "A" com o álcool).
A refinaria, ainda no mesmo ato de saída da gasolina "A", antecipa, também, o
ICMS devido pela venda (saída) da gasolina tipo "C", pelos postos, ao
consumidor.
Todos os valores de ICMS antecipados são assinalados numa única rubrica,
comumente registrada nos documentos fiscais como "ICMS-ST".
Esta técnica de recolhimento remete a obrigação tributária principal
(pagamento de ICMS), exclusivamente, à refinaria (Petrobrás), na qualidade de
substituta tributária, de sorte que nenhum dos demais atores da cadeia
produtiva recolhem ICMS a qualquer título, restando, quanto a estes, tão
somente as obrigações acessórias de escrituração para fins de fiscalização
fazendária.
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Para viabilização do cálculo do "ICMS – ST", devido, repita-se, exclusivamente
pela refinaria, usa-se uma estimativa do preço final praticado perante o
consumidor final, fixado periodicamente pelo órgão competente (Comissão
Técnica Permanente do ICMS - COTEPE).
O resultado da multiplicação desta base de cálculo pela alíquota aplicável
equivale à soma das frações de ICMS devidas em cada fase produtiva, de modo
que a refinaria, ao emitir a nota fiscal de saída da gasolina "A", assinala duas
rubricas individualizadas, quais sejam, o "ICMS Normal" e o "ICMS-ST", que
engloba, repita-se, tudo que seria devido em cada estágio subsequente de
manufaturamento e comercialização, somado num único montante.
A tese defendida pela impetração sustentou que o valor de ICMS devido em
virtude da saída de álcool anidro da usina para a distribuidora deveria ser
revertido para a própria distribuidora, invocando-se o princípio constitucional
da não cumulatividade.
Este princípio dita que o montante do ICMS recolhido em uma fase produtiva
deve ser subtraído, na fase imediatamente subsequente, do importe a que se
chegou mediante multiplicação da alíquota pela base de cálculo, garantindo-se
que somente o valor agregado naquele estágio sofra a incidência tributária, é
dizer, evita-se uma dupla tributação sobre uma mesma base econômica.
É materialmente ilógico falar em utilização de crédito de ICMS por um agente
que nunca recolhe o tributo aos cofres do Estado, porquanto este creditamento
não pode ser dar em dinheiro a ser depositado em conta de titularidade da
empresa, tampouco ser utilizado para outra cadeia produtiva.
O crédito, em todas as ocasiões, quando existente, deve representar um
abatimento a ser computado na saída subsequente àquela que obrigou o
primeiro recolhimento, estando ambas em uma mesma cadeia produtiva – por
exemplo, se a distribuidora comercializa, também, etanol puro, vendido a postos
de combustível, um hipotético crédito relativo à gasolina tipo "C" não pode ser
utilizado para abater o tributo devido pela saída deste tipo de álcool.
As discussões relativas ao sistema de créditos e débitos, na hipótese discutida,
quando muito, são oportunizadas, exclusivamente, à refinaria, porquanto esta é a
única empresa que recolhe ICMS, seja na qualidade de contribuinte, seja na
qualidade de responsável (substituta tributária), registrando-se qua a técnica de
utilização de um preço final estimado como base de cálculo global torna ainda
mais descabidos os questionamentos referentes ao abatimento.
A legislação referente à substituição tributária discutida – Convênio ICMS n.º
03/1997 e Decreto Estadual n.º 22.946/2002 - contém terminologia obscura,
porquanto afirma que o ICMS devido pela saída de álcool da usina à
distribuidora está sujeita a diferimento, termo que equivale à substituição
tributária "para trás" ou regressiva".
Ao utilizar o termo "diferimento" e consignar que o ICMS devido por esta saída
somente será recolhido no momento da saída da gasolina "C", f. 100 e 159, a
legislação induz o intérprete a concluir que o recolhimento global do tributo é
feito pela distribuidora, afinal, diferir é prorrogar o recolhimento para a fase
seguinte (saída da gasolina "C").
Contudo, quando o álcool aporta na distribuidora, a refinaria já antecipou o
ICMS de cada uma das fases produtivas subsequentes, inclusive o devido pela
saída do etanol da usina.
Encerra-se, no texto legal, uma contradição insuperável, porquanto não há como
se conceber diferimento e antecipação em um mesmo ciclo produtivo.
A técnica redacional levou o Juízo a garantir o creditamento do ICMS
requerido pela então Impetrante, que de nada serve para abatimento, já que,
repita-se, a distribuidora nada recolhe em qualquer fase, f. 167/200, 547/564 e
779/810.
Considerando que é a refinaria que recolhe todo o ICMS do ciclo produtivo e
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que a metodologia de cálculo explicada anteriormente (preço final estimado
como base única de cálculo) resulta no mesmo efeito prático da sistemática de
abatimento mediante créditos e débitos isoladamente apurados em cada fase,
alegou-se que o creditamento deferido pelo Juízo resulta em duplicidade, já que
a saída do álcool da usina, em termos didáticos, foi computada pela refinaria
quando do único recolhimento existente, havendo, por assim dizer, dois
creditamentos por um único fato jurídico, um realizado pela Petrobrás e outro
pela distribuidora Agravada.
A tese inspira reflexões e indiscutivelmente permeia a coisa julgada, o que levou
o Juízo da execução a esta Relatoria, quando do indeferimento do efeito
suspensivo, a entender pela impossibilidade de rediscussão da matéria.
Melhor analisando os autos, contudo, diagnostica-se que a tese, da forma como
foi construída, pode e deve ser analisada em sede de execução, considerando-se
a sensível diferença a seguir minudenciada.
O agravante não pretendeu discutir o acerto ou desacerto da Sentença – que, a
título informativo, está dissonante do entendimento do STF a respeito da
matéria, mas, e tão somente, a impossibilidade de sua execução nos exatos
limites objetivos impostos pelo Juízo sentenciante.
Aquele Órgão Julgador, interpretando o Convênio n.º 03/97 e o Decreto
Estadual, adotou a premissa fática de que a distribuidora Agravada efetuava
recolhimentos de ICMS – condição inafastável para o cabimento da discussão
relativa a creditamento – garantindo-se, com base nesta premissa, a utilização
do crédito hipoteticamente computado quando da saída do álcool anidro da usina
em operações subsequentes.
Com vistas a um melhor esclarecimento, colaciono o seguinte excerto da
Sentença, que evidencia a premissa fática adotada pelo Juízo, f. 243:
A impetrante, exercendo sua atividade-fim comercializa a gasolina tipo
"C" (...), entretanto, para alcançar esse objetivo, compra das
Usinas/Destilarias o álcool anidro e mistura com a gasolina Tipo "A",
adquirida da refinaria ou central petroquímica.
Contudo, quando das operações com álcool anidro combustível, para
mistura com a gasolina Tipo "A" e fabrico da gasolina Tipo "C", para
comércio, a impetrante está sujeita ao ICMS de forma diferida.
Observa-se que a então Impetrante nunca se sujeitou ao recolhimento de ICMS,
já que este sempre é adiantado pela refinaria, estando o tributo subordinado ao
regime de substituição tributária para frente, e não a um "diferimento"
(substituição "para trás"), consoante faz crer a obscura redação da legislação.
Em seguida, o Juízo assevera, f. 244:
Com efeito, muito embora seja operação tributada pelo ICMS, ainda que
de maneira diferida, a impetrante não se credita desse valor para débitos
com operações futuras - sem grifo no original.
Note-se que o Juízo, mais uma vez, admite que, em determinada fase da cadeia, é
imputado um débito à distribuidora, frisando-se que, na verdade, isso nunca
ocorre.
E prossegue o Juízo, f. 244:
Entretanto, certo é que a impetrante tem direito a se creditar desses
valores de ICMS diferidos pagos, para debitar do seu ICMS devido em
função da sua operação de saída, como prescreve o princípio da
não-cumulatividade inserido na Constituição da República (...) - sem
grifos no original.
Novamente, afirma que existe um débito de ICMS quando da saída da gasolina
"C" e que este débito e imputado à distribuidora, quando já fora pago, muito
antes, pela refinaria, e repete seu raciocínio na seguinte passagem, f. 245/246:
Como se vê, a intenção mandamental é que seja resguardado direito
constitucional da impetrante à manutenção do crédito de ICMS pago nas
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aquisições de insumos, para que possa utilizar na apuração do ICMS
incidente na saída de sua produção, consoante determina o princípio da
não cumulatividade (...).
Constata-se assim, que as operações referidas são aquisições com
diferimento do ICMS do álcool anidro combustível até o instante da saída
de seu produto (gasolina Tipo "C"), momento em que a Impetrante paga o
ICMS referente à sua saída: Gasolina "C" mais o ICMS do seu insumo:
Álcool anidro.
No seguinte excerto, f. 246, fica claro que a obscura redação da legislação
induziu a conclusão de que a substituta tributária da cadeia era a distribuidora e
não a refinaria:
a) A impetrante adquire insumo (álcool anidro) de produtores
(destilarias), Beneficia-se (transforma em gasolina "c") e os vende a
terceiros;
b) Nesse processo, fica a incumbência, como substituta tributária, a
recolher aos cofres públicos estaduais o valor do ICMS, relativo às
operações anteriores. Além disso, quando promove a saída, fica com a
responsabilidade de pagar o seu imposto. Recolhendo, portanto, ICMS,
tanto com a entrada dos produtos "in natura", como com a saída do seu
final beneficiado.
Extrai-se a sensível diferença entre rediscussão de Sentença transitada em
julgado e a alegação de sua inexequibilidade do seguinte raciocínio: o Juízo,
expressamente, limitou a utilização dos créditos para os recolhimentos
referentes às operações subsequentes, que, por serem inequivocadamente
inexistentes (tais recolhimentos já foram previamente efetuados pela refinaria
no primeiro está produtivo) reduzem a execução ao chamado "valor zero".
Para que não restem dúvidas, colaciono o seguinte excerto da Sentença, f.
256/257.
A liquidez do direito da impetrante ficou demonstrada pela relevância dos
fundamentos da postulação quando se identifica com clareza solar ser
justo e legal a pretensão ao crédito para compensação do valor do tributo
pago na entrada (compra de insumo), com o tributo devido em
decorrência da saída (produto beneficiado).
Ademais, o inciso I, do art. 91 do Decreto Estadual n.º 18.930/97, assegura
a Impetrante o direito a compensação diante do diferimento do imposto
em decorrência de sua condição de substituto tributário (...) - sem grifos
no original.
Ante o exposto, (...), CONCEDO A SEGURANÇA nos termos postulados
na exordial.
[...]
A Agravada apresentou à Administração Fazendária um Documento Auxiliar de
Nota Fiscal Eletrônica - DANFE, f. 666, em que aponta, pura e simplesmente, o
valor de R$ 408.467,47 e o desiderato de ressarcimento sem vinculação a
qualquer saída, subtendendo-se que almeja o depósito do dinheiro referente ao
crédito em conta de sua titularidade ou sua utilização para compensação de
débitos de outra cadeia produtiva, desvinculada do regime de substituição
tributária.
Este creditamento desvinculado de qualquer operação escapa dos limites
objetivos da coisa julgada, que garantiu o uso do crédito, tão somente, para fins
de abatimento em débitos originados em operações subsequentes de saída do
mesmo ciclo produtivo.
Registro, por fim, que a indesejável incursão nos fundamentos da Sentença,
embora escape da mais apurada técnica processual, haja vista seu trânsito em
julgado, fez-se necessária em decorrência da utilização de um dispositivo
remissivo ("concedo a segurança nos termos postulados na exordial"), sem a
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qual o Colegiado não poderia alcançar o necessário conhecimento da realizada
fática e jurídica atinente ao feito.
Não se está, nesta oportunidade, censurando a utilização de uma premissa
equivocada pelo Juízo – isto, sim, violaria a coisa julgada – mas, apenas,
afirmando-se que o creditamento de um valor desvinculado de uma operação
subsequente da mesma cadeia produtiva não foi albergado pela Sentença,
sequer implicitamente – o Julgado garantiu, tão somente, a utilização de
creditamento para operações da saída da gasolina "C" que geram débitos
imputáveis á distribuidora, situação que nunca foi nem será verificada na
realidade prática, independentemente de qualquer diligência probatória.
Posto isso, conhecido o Recurso, dou-lhe provimento para anular a
Interlocutória combatida e extinguir a execução em curso no primeiro grau por
inexequibilidade do título judicial.
Ponderados esses elementos, passo à análise das razões contidas no
apelo nobre.
Registro, por primeiro, que o acolhimento de recurso especial por
violação do art. 535 do CPC/1973 pressupõe a demonstração de que a Corte de origem, mesmo
depois de provocada mediante embargos de declaração, deixou de sanar vício de integração
contido em seu julgado, o que não ocorreu na espécie.
Com efeito, conforme acima evidenciado, o Tribunal a quo, no acórdão
recorrido, foi claro ao expor as razões pelas quais entendeu que a sentença mandamental
transitada em julgado seria inexequível e, por isso, afastou a alegação de que a decisão
administrativa que negou o pedido de compensação teria malferido a coisa julgada.
Afasto, pois, a alegada violação do art. 535 do CPC/1973.
No que tange ao juízo de reforma, a recorrente, calcada em suposta
afronta aos arts. 467, 471, 473, 474 do CPC/1973, defende a tese de que, in casu, foi
desobedecida a autoridade da coisa julgada, por entender que a sentença mandamental transitada
em julgado teria recebido do Tribunal de origem interpretação que indevidamente limitou os
efeitos objetivos estabelecidos pelo título judicial.
Em preliminar, a Fazenda Pública, recorrida, alega que essa pretensão
recursal não deve ser conhecida, porquanto esbarraria nos óbices estampados nas Súmulas 283
do STF e 7 do STJ.
Sustenta o ente público que a empresa recorrente não impugnou o
fundamento contido no acórdão recorrido de que a sentença mandamental não teria assegurado
que o crédito fosse satisfeito mediante "depósito em dinheiro referente ao crédito em conta de
sua titularidade ou sua utilização para compensação de débitos de outra cadeia produtiva,
desvinculada do regime de substituição tributária".
Entendo, todavia, que essa razão de decidir foi suficientemente
impugnada pelos seguintes trechos do recurso especial, que assentam ter a sentença assegurado,
na hipótese de impossibilidade de compensação, o direito ao ressarcimento (e-STJ fls. 1.020 e
1.023/1.024):
Em síntese, é conteúdo da coisa julgada material formada a certificação do
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direito da impetrante de ver reconhecidos e satisfeitos, administrativamente, os
créditos apurados em razão do ICMS incidentes nas operações de aquisições de
álcool anidro e de saída da gasolina tipo "c", cujos valores são retidos pela
refinaria no momento da aquisição da gasolina tipo "a". A decisão não
condicionou a eficácia da certificação à condição (inexistente) da impetrante de
substituta tributária ou de que impetrante não pagaria o ICMS pela aquisição de
álcool anidro (também inexistente), fatos que não poderão ocorrer e que são
contrário á própria fundamentação da demanda e ao objeto litigioso do
processo.
[...]
O caso dos autos é TOTALMENTE diferente da teoria do dano zero, visto que

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